29 de ago. de 2012

Até o sol


Dos rótulos, prefira ser humano:
antes de algo, seja homem.
Não tenha nome; seja ideia.
Não compre amigo; plante cúmplice
de vida,
de sonho,
do concretizar tal sonho.
E jamais tema pedras:
use asas pra ser livre.
Se cansar, não tem problema;
te levo nas minhas
até o sol.

Mergulhão
aos Psolistas do Amapá
depois aos do Brasil

23 de ago. de 2012

As-tu déjà aimé ?


Salut, mes amis. Aujourd'hui je vous présente “As-tu déjà aimé ?”, une chanson composée par Alex Beaupain. Elle est dans le film "Les chansons d'amour", de Christophe Honoré; 2007. Regardez :


Erwann :
− As-tu déjà aimé
pour la beauté du geste ?
As-tu déjà croqué
la pomme à pleine dent ?

Pour la saveur du fruit
sa douceur et son zeste ?
T'es tu perdu souvent ?

                            Ismaël :
                            − Oui, j'ai déjà aimé
                            pour la beauté du geste
                            mais la pomme était dure.
                            Je m'y suis cassé les dents.
                            Ces passions immatures,
                            ces amours indigestes
                            m'ont écoeuré souvent.

Erwann :
− Les amours qui durent
font des amants exsangues
et leurs baisers trop mûrs
nous pourrissent la langue.

                            Ismaël :
                            − Les amour passagères
                            ont des futiles fièvres
                            et leur baiser trop verts
                            nous écorchent les lèvres.
                            Car a vouloir s'aimer
                            pour la beauté du geste
                            le ver dans la pomme
                            nous glisse entre les dents.
                            Il nous ronge le coeur,
                            le cerveau et le reste,
                            nous vide lentement.

Erwann :
− Mais lorsqu'on ose s'aimer
pour la beauté du geste
ce ver dans la pomme
qui glisse entre les dents
nous embaume le coeur
le cerveau et nous laisse
son parfum au dedans.

                            Ismaël :
                            − Les amours passagères
                            font de futils efforts
                            Leurs caresses ephémères
                            nous fatiguent le corps.

Erwann :
− Les amours qui durent
font les amants moins beaux
Leurs caresses, à l'usure,
ont raison de nos peaux.


Le chanteur

Je m'présente, je m'appelle Henri. J'voudrais bien réussir ma vie, être aimé. Être beau gagner de l'argent, puis surtout être intelligent. Mais pour tout ça il faudrait que j'bosse à plein temps.
J'suis chanteur, je chante pour mes copains. J'veux faire des tubes et que ça tourne bien, tourne bien. J'veux écrire une chanson dans le vent, un air gai, chic et entraînant pour faire danser dans les soirées de Monsieur Durand.
Et partout dans la rue j'veux qu'on parle de moi. Que les filles soient nues. Qu'elles se jettent sur moi. Qu'elles m'admirent, qu'elles me tuent. Qu'elles s'arrachent ma vertu.
Pour les anciennes de l'école devenir une idole. J'veux que toutes les nuits éssoufflées dans leurs lits. Elles trompent leurs maris dans leurs rêves maudits.
Puis après je f'rai des galas. Mon public se prosternera devant moi. Des concerts de cent mille personnes où même le tout-Paris s'étonne et se lève pour prolonger le combat.
Et partout dans la rue j'veux qu'on parle de moi. Que les filles soient nues. Qu'elles se jettent sur moi. Qu'elles m'admirent, qu'elles me tuent. Qu'elles s'arrachent ma vertu.
Puis quand j'en aurai assez de rester leur idole je remont'rai sur scène comme dans les années folles. Je f'rai pleurer mes yeux. Je ferai mes adieux.
Et puis l'année d'après je recommencerai. Et puis l'année d'après je recommencerai. Je me prostituerai pour la postérité.
Les nouvelles de l'école diront que j'suis pédé. Que mes yeux puent l'alcool. Que j'fais bien d'arrêter.
Brûleront mon auréole, saliront mon passé.
Alors je serai vieux et je pourrai crever. Je me cherch'rai un Dieu pour tout me pardonner. J'veux mourir malheureux pour ne rien regretter.
J'veux mourir malheureux.

Daniel Balavoine

21 de ago. de 2012

As três margens de um rio

Um escorpião precisou atravessar um rio. Como não sabia nadar, pediu ajuda a um sapo-cururu ali perto. Assim, o escorpião subiu às costas do anfíbio e os dois foram. Na outra margem do rio, o escorpião espirrou e, no espasmo, o sapo sentiu seu ferrão.
– Mas que merda, companheiro! Tu me ferraste, eu vou morrer! – gritou o cururu.
– Não... eu não...
– Seu safado, filho de puta barata! Eu te ajudo e tu me fazes isso?! Achas que sou teu pelego?!
– Camarada, deixe-me explicar...
– Ora, vai te foder! Não me venha com falácias ou o vãos trocadilhos sobre natureza, “Ah, é da minha natureza.”; natureza o caralho! Mas toma o teu: eu também tenho minhas armas! Vais morrer também e será mais rápido que a mim!
Alguns segundos se passaram. O escorpião agonizou ao sentir o efeito da toxina leitosa do anfíbio, contorceu-se ao chão e morreu.
– Engole essa merda de natureza! Porra... pior que agora sou eu...
O sapo lá ficou esperando o último sopro. Nada.
– Vai ser a qualquer momento...
Então o sapo percebeu que o escorpião não tinha ferrão. Tratava-se de um artrópode portador de uma rara deficiência física. O lacrau, ao espirrar, apenas encostou suas pinças nas costas do sapo, para não cair na água.
O sapo olhou para um lado, depois para outro. Sacudiu a cabeça, balbuciou algo como “coisas da natureza” e “culpa da cadeia: um dia é da caça” e foi embora, à outra margem do rio. Lá havia outro passageiro em potencial.

de Mergulhão
para Jorge Sanches

9 de ago. de 2012

Que seja

Tenho refletido muito sobre tudo. Não um apego descontroladamente saudosista ou desejo de concretização de sonhos. Não. É quase como uma Sofia de Gaarder. Então me deixo à deriva do perder-se no passado, quando a preocupação única era dar fim ao dever de casa para só depois ligar os trecos eletrônicos ou trepar em árvores vizinhas. Bons tempos. Joelhos ralados. Banho de chuva às seis. Quilos de terra sob os pés. Surra paterna.

Agora é a vontade de ficar. Só. Ficar. Pairar. Observar tudo por cima. Por outros olhos, estar abaixo. Autocomiseração voluntária porque satisfaz. Por enquanto. Porque sei que após uns maços isso passa. E vou querer passar. Mas depois. Agora não; quero o estar que me causa bem. Presente? Sim. Não mais-que-perfeito; não julgo. Só sou esse estar. Porque apraz e satisfaz, eu já disse. Vivendo simplesmente porque o instante existe – aquele outro eu já disse.

É preciso o navegar-se em viagem às extremidades de si mesmo. Então assisto a corpos alheios querendo-se igualmente querendo-os. Para tê-los, não os ser. Mas não posso porque só assisto. Melhor assim. Senão enjoo, jogo fora, não reciclo e volto a ser o estar presente.
Assisto a vidas alheias em estado de destruição consciente de seu ser. Seres que agonizam por falta de altruísmo. O que os torna fúteis. Talvez seja por isso minha a vontade do meu hoje. Descartar o fútil. Por isso o celular ao canto da sala escurecida por tocos de velas espirrando. Patético, sei, mas é o querer que, caso não se atenda, cresce e inútil suicídio tornar-se. O também querer uma casa de um campo onde se possa colher amigos, livros, discos e tudo o que valha uma pena de poeta.
Que seja.
Fico por aqui, caro destinatário. Vou voltar ao tinto fino senão amarga. Qualquer coisa, você sabe onde eu estou: no ser. E, se lá eu não mais for, basta um mergulhar exato em um outrem qualquer. Afinal, isso não é de hoje. Está. Já disse.

Mergulhão

3 de ago. de 2012

Falta

João esperava impaciente no caixa porque a velinha corcunda ainda não acabara de pagar pelo quilo de carne de segunda com o qual alimentaria seus quatro netos. O dinheiro não dava; seis reais a menos. A velha chorava. Ela precisava, sim, levar a comida. Bolsa Família sempre acaba antes do mês. Chorava. “Dona Amélia, eu não vou mais deixar fiado!” gritou o atendente. Não era de seu feitio, mas João condoeu-se. Deu seus últimos seis reais do dia à velha. “Agradecida, meu filho. Que Deus te reserve um futuro bom.”. João não queria Deus; só a habitual carteira de Hollywood. Sem cigarro, ele voltou pra casa. A velha ia na frente; mesma rua. A sacola pesava muito; João carregou-a até a velhinha chegar ao seu casebre. O rapaz seguiu sozinho a pé por mais vinte minutos; sem seu cigarro; sem o deus de Amélia. Deveria se sentir bem por ter feito algo bom a outrem? Na porta de casa, foi abordado por um menor, como ele; mesma idade. Não havia dinheiro. O menor lhe tomou seus tênis. O celular foi disputado. O menor lhe perfurou um rim e girou a faca. Alguns minutos depois, João agonizava sozinho na calçada, querendo o último cigarro. Vinte e alguns minutos depois, o menor voltou pra casa. Tragou um cigarro, tirou os tênis novos, lavou a mão vermelha e sentou-se à mesa. Seus três irmãos mais novos lá estavam. A avó lhes serviu carne de segunda. “Agradecida, meu Deus, pela janta. Que nunca falte.”.

Mergulhão