29 de jul. de 2013

Roda-viva

Dos fundamentos de Gaia
sou todos.
A terra é o meu corpo.
A água é o meu sangue.
O ar, o meu suspiro.
O fogo é a essência que faz
meu espírito prosseguir vivo.

Dos filhos da Terra
somos todos.
E nessa caldeira de forças vitais
permaneceremos unidos
porque folha não cai sem propósito,
onda não aporta sem motivo,
rebento não vem sem um querer.

Divinos
nós somos.
Pois somos feitos de um mesmo porquê.
O fruto que outrora enfeitava videira
hoje é fermento de cria faminta,
que ao chão deposita a ciente semente
que outra hora será boa nova vida.

Era uma vez um pescador.
Ele acordou e deu bom dia ao Sol.
Inflou seus pulmões com vento
(que içou suas velas) e foi ter no rio
 o mesmo rio antes congelado,
que pelo Sol foi liberto
e ao pescador deu sustento.

Cabe-nos, pois, ser tal ciclo
e cultivar o moinho
que é grande Mãe Terra em vida.
Assim, gire e molde também,
pois tudo se pode fazer
desde que se faça o bem
para que todos se amem.

Mergulhão

12 de jul. de 2013

CEP

Um amor distante me possui. Estrangeiro de meu eu. Lá onde o sol nasce primeiro; o dele antes que o meu. Assim, enquanto ele se arruma para tomar o ônibus já lotado, eu ainda sonho com a lembrança da baunilha em seu pescoço; os dois, apertados, em concha, na cama testemunha. Dizem que amar distante é se consumir a deriva ainda que em terra. Eu pouco me importo se morro diariamente por me aventurar. Sempre tive a bússola desnorteada. Cabe-nos, a esse amor forasteiro e a mim, saber que, no Atlântico da vida, ele é o arquipélago da jangada que sou. O amor longínquo serve para nos aproximar do que nunca podemos acenar adeus. A certeza de que devemos ir além. Basta colocar três cuecas, cantil, pandeiro, sabonete, colher e isqueiro na mochila parceira e ir. Só se cria momentânea raiz quando as asas temporariamente cansam; então serão dois pares destas se o novo voo proposto partilhar o fruto que da raiz proveio. Porém, cuidado, amigo errante: amor distante não é ausente. É o presente que, por ora, recebe postais em CEP do seu diferente – somente. Do contrário, faz-se longe de fato e por escolha. E não sente.

Mergulhão

4 de jul. de 2013

Ton sur ton

Os lábios dele são vermelho-fogo.
Os dela, amarelados:
estranho batom.
Por mais que tentem,
seus beijos nunca são alaranjados;
tampouco quentes.
Os beijos que roubo são roxos
e queimam-me a boca.
Tenho lábios azuis.
Viril batom.

Mergulhão