20 de jun. de 2014

Xêro

Cafuneio teus cabelos logo de manhã bem cedo
pra qu’eu fique com teu cheiro todo o dia em cada dedo.
E se eu uso o travesseiro teu durante a tua ausência
é pr'afugentar receio do esquecer de tua fragrância.
Nem teu hálito às três e trinta de uma madrugada
me parece como o lado de uma cama há mui mofada.
Saiba qu’inda que te sirvas do teu mais caro perfume,
sobra à Rosa das Mais Rosas, comparada a ti, chorume.
Só por isso, amor, exala e deixa longe ir teu rastro;
pois se às cegas eu bem posso te sentir de castro em castro,
quem dirá inebriado, eu, errante pelo mundo:
te coroo suserana deste sujo vagabundo.

Mergulhão

2 de jun. de 2014

Perpétua dor

Vi-te andando pela lua
toda nua de segredos
ao surgir do alheio sol.
Cada passo que tu davas,
muita angústia te escorria.
Como o choro de um peixe
que se choca com cardume
que o arrasta para o cume
de um mar morto em extensão.

Então li que eras crua,
pois fizeste, dos teus medos,
colcha, pantufa e lençol.
Alimentavam-te larvas,
ordenhava-te sangria;
nos teus olhos, nem um feixe
do que antes era o lume
do motivo do ciúme
de qualquer constelação.

Quero que saibas ser tua
diária conta de meus dedos,
a lamúria em ré bemol,
possessão em virgens canvas,
oração e romaria
que mui fiz pra que te deixe
a tristeza que te assume
e mesmo sem fome ou gume
te lacera o coração.

Mergulhão