27 de ago. de 2014

Panapaná-cardume (ou Sobrenaturalidade)

Tu que cozes meu amor
à marinada,
sabes bem que nada sou
sem ti, menina.
Como orquídea azul me enfeitas
a varanda
que meu coração  teu feudo 
há mui circunda.
Posso ser piegas, abissal clichê;
mas só quando não te tenho o nada sobra:
nada-soul,
a nada vou,
em nada voo;
nado a dor
a lufadas de panapaná-cardume de peixinho-borboleta
que sem fôlego mergulha céu a mar.
Que não sobre nada, pois,
de nosso amor
quando nós formos depois
alimentar
o rito da vontade mutual de
(sobraçados
sobre estrelas supernovas)
sobre o peito um do outro parolar
sobretudo
sobre nada em
sobrenaturalidade
 sobremesa para a vida confeitar.


Mergulhão;
para Genniffer Moreira.

18 de ago. de 2014

3x4

Quem nunca furtou 3x4
de bolso de amigo
não sabe saudade.


Mergulhão

12 de ago. de 2014

Tricovitrola

Era uma vez uma agulha-tricô.
Posta à janela após morte de avó,
lá quis ficar a fazer companhia
ao cego triste surdo insone avô,
pois assim ambos não seriam só
contos antigos da Má Carochinha.

Mesmo que nada escutasse o bom velho,
não lhe faltava na casa a viola
que junto à velha prestou sua vigília.
Mas eis que num fim de tarde vermelho
o enrugado viúvo a vitrola
deixou tocar uma antiga modinha.

Então agulha-tricô sentiu vida:
ouviu agulha-vitrola soar
e retiniu toda em Si-alegria.
Em meio às notas lhe veio a dúvida.
 Como podia metal bem cantar?
Logo esqueceu malha, lã, fibra e linha;

pel'outra agulha se frivolitou
e fez rotina a canção de sua amiga
toda hora sétima do pôr-do-dia.
Até que a Morte o velhinho abraçou
e seus seis filhos se puseram em briga
por cada bem que o defunto detinha.

Foi assim que vitrola emudeceu;
levou consigo agulha tagarela,
ao que a dos fios macramou-se agonia.
Por pouco tempo, no entanto, sofreu.
Pois viu, manhosa, de sua janela,
haver vitrola na casa vizinha.


Mergulhão
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Frivolitê: técnica de tecer nó e picô cuja sequência forme renda.
Macramê: técnica de tecer fio sem ferramenta.

8 de ago. de 2014

Stardust

Desliga essa tevê.
As séries são as mesmas: muda-se apenas o mudo rosto branco bonitinho.
Veste tua skinny preta e a regata que deixa à mostra cada estêncil nos teus braços magros.
Posta que será o último nascer do sol sob o qual amor faremos.
Aposta que o amanhã talvez não mais acorde com tal nome.
Já temos fissuras por dentro, meu caro.
Finos como a lágrima difícil que alcança o queixo.
Tu sabes que o agora vale mais do que a espera, que atrasa ― eu falei.
Pega o Opala.
Tira esse grunge e põe Floyd.
Vamos bater nalguns muros hoje à noite.
No canto roubamos Marlboro e Bacardi.
Por que preservar nossos corpos se somos de estrelas só pó?
Toda vida é um contrato que se quebra unilateralmente.
Fica ao meu lado e eu te minto que não haverá falta a sentir.
Deixa as lembranças a quem insiste em ficar. E a sujeira. E os boletos.
Renega imortalidades; a agonia do titã é para sempre estar sozinho.
Toma o desejo do voo e vai reto.
Lembra que teu pai nos disse “you’re so sad...” e morreu?
Era sadistic; eu creio.
Façamos então sua vontade.


Mergulhão

Tecelão

Com uma só linha
vermelho-paixão
o amor teceu
tua vida na minha
e vi-me então
amor-
tecido.


Mergulhão